sábado, 19 de março de 2011

Vamos nos permitir




Aprendemos na vida os sonhos que a sociedade inventou, aprendemos a depender da admiração de outros, e é assim que nos condenamos ao sofrimento.
Nossos sonhos e nossa admiração por nós mesmos precisam brotar em nosso interior, antes de tudo.
O apreço que podemos desenvolver por nós mesmos surge da aceitação de quem somos e do quanto gostamos de quem somos.
Mas não nos foi ensinado nada disso. Não nos ensinaram o amor próprio.
O que aprendemos na vida se resume em seguir padrões de comportamento aceitáveis pela sociedade. Se não seguimos esses padrões, somos julgados impiedosamente, excluídos e marginalizados.
E quem somos realmente, nosso ser real, fica lá no fundo, sufocado. Tentamos ignorar o que sentimos verdadeiramente.
Talvez seja por isso que as emoções nos assustam tanto.
Tentamos controlar os impulsos e os desejos como se fossem perigos extremos em nossas vidas. Evitamos emoções, quando são elas que dão o verdadeiro sentido de nossa vida.
Talvez o sentido da vida seja o de se permitir sentir.
O maior presente que temos, e que dá sentido a tudo que vivemos são os sentimentos. Ainda que seja a dor, a tristeza, a desilusão. Porque nesse processo há um grande aprendizado que é o amadurecimento. 
Mas, não nos permitimos sentir.
Ninguém deseja a dor, é claro. Mas com medo de senti-la, buscamos alívios imediatos, como vícios que nos levam à fuga temporária. Ou muitas vezes, com o medo de sofrermos, ficamos racionais e frios.
Como consequência de não olharmos para a origem da dor, ela certamente voltará cedo ou tarde. Podemos até pensar que controlamos, que demos a volta por cima, que estamos no comando. Mas na verdade só sufocamos ou anestesiamos sentimentos. São os sentimentos que sinalizam quem somos realmente, se estivermos dispostos a olhar para dentro.
Nem sempre queremos ver. Não nos damos o direito de sentir.
Se sentirmos um amor no fundo da alma, não precisamos de expectativas pelo que sentimos – quando apenas permitir sentir é uma bênção por si só.
Os desejos também são emoções que podem ser permitidas. Mas logo o qualificamos de forma ruim, espelhados pelo que o meio social supostamente julga, e o reprimimos.
Claro que temos a capacidade de pensar e analisar o que é verdadeiramente bom e o que é destrutivo, no amor e no desejo.
Não somos animais irracionais que agem só a partir dos instintos. Mas também somos animais, mesmo com toda nossa suposta racionalidade. Temos instintos mais lapidados, mas os temos.
O corpo estremece, as mãos suam, os olhos brilham, o coração dispara.
O corpo inteiro dá sinais. E mesmo que não haja uma entrega plena a esses impulsos e sensações, há que se permitir o sentir.
E dizer pra si: “Sim, estou com medo, estou confusa, estou apaixonada, eu sinto desejo!”
Quando aceitamos o que somos e sentimos, libertamos a nós mesmos da espessa casca que construímos com base no que a sociedade nos ensinou.
Ao aceitar o que sentimos, temos uma vida mais intensa. Aprendemos, crescemos, experimentamos.
Surgem as dúvidas e elas nos agitam, balançam, mobilizam. E mesmo que nunca se encontre uma resposta em meio ao turbilhão de emoções, algum tempo depois estaremos mais fortes, mais capazes e mais inteiros.
Se simplesmente sufocarmos os sentimentos, as situações desagradáveis só tenderão a se repetir. Sentiremos frustrações ao percebermos que o tempo passou. E nos questionaremos: "O que foi que eu fiz em minha vida? O que eu vivi de fato?"
Não haverá uma resposta satisfatória se não nos permitirmos viver. Ainda que doa, ainda que não se realize, ainda que o resultado de uma experiência seja frustrante – se nos permitirmos, se nos apoiarmos em nossas ações e soubermos que consequências são naturais – se estivermos firmes em nossa jornada, companheiros de nós mesmos e de nossos sentimentos, poderemos dizer “Eu amei, eu desejei, eu odiei, magoei-me, arrependi-me, chorei, sorri, sofri, fui feliz. Eu pensei e me permiti sentir! Sim, eu vivi! Eu estou viva.”

Como diz a letra da música "Tempos Modernos, de Lulu Santos":
"Hoje o tempo voa, amor
Escorre pelas mãos 
Mesmo sem se sentir
Que não há tempo que volte, amor
Vamos viver tudo o que há pra viver
Vamos nos permitir!"




Nenhum comentário:

Postar um comentário